
Nossas escolhas de consumo como declarações políticas. Já tinha pensado que, ao escolher seu vinho, seu almoço ou sua roupa, você está fazendo uma declaração política?

Esse é um dos motivos pelos quais eu, cada vez mais, tenho me inclinado para os vinhos naturebas. Não falo sobre os “pseudo naturebas” – aqueles que até se enquadram no “check list” da fermentação espontânea/mínima intervenção mas que não têm, em sua concepção, o comprometimento com uma filosofia de respeito à terra e às pessoas que vivem dela e nela e àqueles que herdarão o planeta de nós.
E todo esse preâmbulo é para falar de um produtor pequenininho no Etna, minha mais recente paixonite (e que planejo visitar muito em breve!). Aos pés do vulcão mais ativo da Europa, a Etnella @etnella de Davide Bentivegna maneja uma área total de 19ha. Os vinhedos são só 8ha, parte pré-filoxera, e são permeados por outras culturas que, dos solos duros de lava em constante mutação (cada suspiro do vulcão é um flash!) produzem de forma respeitosa além de vinhos também azeite, cidra e geléias variadas.
E, para nossa sorte, esses vinhos chegam ao Brasil! Estão no portfólio da @vincivinhos e tive a oportunidade de conhecê-los – o que só reforçou minha vontade de ir provar e conhecer a produção in loco (eles têm restaurante e pousada aos pésdo vulcão).

Os vinhos são aquela festa de variedades autóctones: Nerello Mascalese, Nerello Cappucio, Catarratto, Minnella, Inzolia, Grecanico, Zibibbo… vinhos sempre muito aromáticos, delicados, sem aquele álcool bombado que dá uma “nivelada por baixo”, na minha atual opinião.
Provamos o portfólio brasileiro todo:
- Kaos Bianco 2022
Um laranja de respeito. cheio de personalidade. Produzido com Carricante, Catarratto, Malvasia, Moscato e Trebbiano. As vinhas têm entre 40 e 90 anos e são plantadas no tradicional “arborello”. São 12 dias de maceração com as cascas e 10 meses de afinamento em barricas de acácia e cimento. “Só” 11% de álcool contribuem para a drinkabilidade. Tem aromas de ervas e minerais, como toque salgado que lembra a proximidade do mar.
- Kaos Rosso 2020
Vinho top da vinícola composto pelo blend típico da Sicilia: Nerello Mascalese (85%) e Nerello Cappuccio (15%). Boca complexa, que mistura rusticidade e elgância. Abundante em aromas de frutas vermelhas e a acidez esperada. Final persistente e guloso.
- Artigiano Rosso 2022
Um terre Siciliane Rosso IGT com taninos finos e acidez crocante. Nariz cheio de frutinhas vermelhas típicas da Nerello Mascalese. Os 13% de alcool contribuem para um corpo na medida exata da elegância e frescor.
- Attia Bianco 2022
O charme desse blend de Chasselas Hybrid (30%), Trebbiano (25%), Carricante (20%), Moscato (10%) e Grecanico (5%) já começa pela etiqueta, uma caricatura que apresenta todas as pessoas importantes para a Etnella. Attia significa “a ti”, como nos explicou Davide. Tem uma curta maceração pelicular de 2 dias e afinamento em inox e cimento por 10 meses. Fresco, tem um toque de chá verde e ervas no nariz com bom corpo para um branco.
- Orientale Sicula Rosato 2022
Um rosé delicioso e muito diferente. As vinhas de Nerello Mascalese (tinta) ficam na parte norte do Etna a 500 metros de altitude (a localização exata vem mostrada na etiqueta – achei uma graça!). Esse é o único dos vinhos provados em que há adição de sulfitos. Aromas muito vivos de frutas vermelhas embalados numa acidez salivante. Delicioso.

Claro que adorei o vinho laranja, mas queria mesmo falar dos tintos, baseados na Nerello Mascalese – essa uva tão particularmente siciliana, delicada e rústica, crocante e cheirosa (se nunca provou, recomendo testar urgentemente!). Queria muuuuuuito ter provado o petnat de Nerello Mascalese, mas nenhuma das míseras 600 garrafas produzidas chega por aqui ainda – esse vai ficar para a experiência in loco!