O castelo do vinho Brunello é famoso, mas eu não fazia ideia da dimensão da Banfi: tratados científicos, tanques e garrafas especialmente desenvolvidos, seleção do super clone de Sangiovese (dentre os 650 encontrados na propriedade), zero adição de sulfito… Conheça um pouco mais sobre o trabalho (e, claro, os vinhos!) desses control freaks.
O Brunello do castelo ou o castelo do Brunello?
O famoso castelo no alto da colina toscana coberta em vinhedos é já velho conhecido dos brasileiros. Todo enófilo reconhece quase instantaneamente o vinho com o “rótulo do castelo” pelas prateleiras mundo afora: afinal, trata-se de um Brunello, vinho de denominação de origem cultuada e desejada pelos conhecedores.
O castelo em questão é o Castello di Poggio alle Mura, em Montalcino na Toscana – um edifício do século 12 totalmente restaurado e que abriga parte da estrutura turística da Banfi que inclui 2 restaurantes e 1 hotel super exclusivo.
Um projeto ambicioso
Mais que ser uma marca registrada da Banfi, o castelo é também uma das razões que levou à compra das terras, em 1978, pela família Mariani. A presença do castelo e o desejo de produzir vinhos de excelência – com um projeto visionário e ambicioso que beneficiasse “a todo o povo de Montalcino, da Itália, dos Estados Unidos e aqueles que amam o vinho de qualidade” – como declarou John Mariani em seu discurso de inauguração da bodega de Castello Banfi, em 12 de setembro de 1984.
Hoje, mais de 30 anos depois, o projeto já se espalhou por outras áreas na Toscana e no Piemonte. Além dos números impressionantes, o viés de pesquisa científica e os desenvolvimentos alcançados deixaram a engenheira-enófila aqui toda curiosa.
Control freaks
Somos control freaks. Com essa afirmação Philippe Marconi, diretor de exportações da Banfi nas Americas, explica a busca por conhecimento e controle – que vão desde os solos até as garrafas – e as inovações pelos quais o grupo é responsável. Essa motivação levou ao cuidadoso mapeamento de cada centímetro dos quase 3.000ha de vinhedos da propriedade, juntamente com cada parreira que ali havia. E eram muitas parreiras!
650 clones de Sangiovese
Apenas de Sangiovese, a principal cepa tinta Toscana, o projeto Banfi, em conjunto com a Universidade de Milão, mapeou 650 clones distintos! Deste universo, selecionaram os 180 clones com melhor potencial para aprofundar os estudos: foi criado um vinhedo experimental e cada clone foi vinificado separadamente em micro escala, para identificar os que melhor se adaptavam à região e expressavam as melhores características da variedade e do terroir.
Levou “só” cerca de 10 anos para concluir o estudo, mas foram identicados 15 superclones e, desde 1994, todas as novas plantações são composições de pelo menos 3 desses clones, selecionados por suas características complementares entre si e adequação ao terroir. Nerds como eu podem conferir mais detalhes aqui >>
Outros detalhes a controlar
A pesquisa clonal foi certamente a linha que mais me chamou a atenção no trabalho científico da Banfi, mas a “obsessão por controle” do grupo se manifesta em vários outros aspectos, como a confecção das próprias barricas para envelhecimento dos vinhos (desde a escolha das árvores nos mais prestigiados bosques franceses!), o desenvolvimento de cubas de fermentação híbridas, fabricadas com madeira e aço inox, permitindo uma espécie de vinificação em carvalho com controle de temperatura e outros detalhes da fermentação, garantindo a obtenção de vinhos mais suaves, menos adstringentes e menos amargos.
As cubas híbridas, na verdade, são apenas uma parte um projeto filosófico e de controle maior, que incluiu o desenvolvimento de toda a planta de vinificação, batizada Horizon. São muitos detalhes e que talvez ainda dêem origem a um podcast!
Consciência e sustentabilidade
Como bônus pelo zelo e rigor nos controles, desde a colheita até o engarrafamento, a Banfi se orgulha também pelo manejo racional e sustentável dos campos, desde o projeto Bio-Red (ZERO dispersão de resíduos de petróleo e tratamentos agrícolas no meio ambiente desde 2008), ZERO adição de sulfitos aos vinhos, economia de recursos hídricos superior a 80% (por micro-irrigação e captação de águas pluviais) e, para mim o mais desafiador: a garrafa mais leve.
O desafio da garrafa mais leve
Um grande desafio, assumido com coragem pouco comum pela Banfi, é a redução no peso das garrafas de vidro. Isso porque o consumidor (ainda) associa o peso da garrafa à qualidade do vinho ali contido. Estive em abril de 2019 no Centro de Pesquisas da Concha y Toro no Chile por exemplo e, dentre todos os esforços que eles estão fazendo para diminuir sua pegada de carbono (e sim, são muitos!), nada constava com relação ao peso das garrafas de vidro. Talvez as prioridades no árido Chile no momento sejam outras, mas o peso do vidro das garrafas tem povoado meus pensamentos à tempos, e eu estava ansiosa para conhecer um produtor disposto a desafiar esse paradigma.
Pois desde 2009 a Banfi já passou das garrafas Bordeaux padrão de 570g para garrafas de 400g e, finalmente, garrafas de 360g na segunda metade de 2014 (isso em cerca de 30% de seus vinhos, já que aqueles vdestinado a guarda seguem usando garrafas mais robustas).
Fiz uma “conta de padaria” com os números informados no site (não resisti!): desde a adoção das garrafas mais leves foram economizados cerca de 5,4 mil toneladas de vidro! Além da economia de matéria prima virgem, são quase 15 mil toneladas de CO2 a menos na atmosfera (os nerds podem checar esses números aqui >>)
E os vinhos Banfi?
Ok: números, pesquisa científica de ponta e sustentabilidade talvez não sejam motivadores para a maioria dos enófilos. Passemos para os vinhos então, já que tive a oportunidade de degustar alguns essa semana: desde a linha Centine, concebida para ocasiões informais, até o imponente Brunello (aquele do castelo!).
Os vinhos Banfi chegam ao Brasil pela importadora World Wine.
Centine Bianco IGT 2016
Refrescante e descomplicado, com acidez e mineralidade bem marcadas mas de corpo nem tão ligeiro – resultado da fermentação e maturação de 4 meses em barricas de carvalho e contato com as leveduras. No nariz, entrega o corte de Sauvignon Blanc, Chardonnay e Pinot Grigio: com notas de flores brancas, pêra, pêssego e cítricos.
Centine Rosso IGT 2016
60% Sangiovese, 20% Merlot e 20% Cabernet Sauvignon. Na boca é elegante, com taninos finos e acidez média alta que lhe confere frescor. Aromas de cerejas negras e chocolate amargo. Estagia por 6 meses em barricas de carvalho (francesas, claro! Feitas a partir de árvores diretamente escolhidas nos prestigiados bosques Allier, Nevers, Fontainebleau e Tronçais, como qualquer control freak faria!).
ASKA Bolgheri Rosso DOC 2015
Já em outro patamar de corpo e complexidade, esse Super Toscano, mescla de Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc. Apesar de mais encorpado, ainda se mostra elegante. Os aromas evocam a frutas vermelhas e pretas, com toques de tabaco. Acompanhará bem carnes vermelhas, inclusive as mais gordas. Curiosidade: a palavra “aska” tem origem etrusca e significa frasco – de vinho ou de perfume.
Castello Banfi Rosso di Montalcino DOC 2016
Um 100% Sangiovese dos típicos solos calcáreos da Toscana (sério: calcáreo por lá chega a ser um problema, entupindo canos e manchando tudo – tem até uns produtos de limpeza específicos). Corpo médio, acidez média+, 12 meses de passagem por barricas e bottis. Ótimo para acompanhar pizzas, massas com molho de tomates e carnes magras.
Castello Banfi Brunello di Montalcino DOCG 2013
Grande clássico da região e motivação original do projeto Banfi. 100% Sangiovese Grosso, como requer a legislação, mas só com os clones selecionados pelos 20 anos de pesquisa que eu comentei acima. Requer aeração para desprender os aromas de frutas vermelhas maduras; sobressaem as notas terrosas, de tabaco e couro. É ainda jovem e apresenta taninos firmes, que devem amaciar com mais envelhecimento. Mereceu 92 pontos RP (Robert Parker) e 95 JS (James Suckling)
Oi, amei seu post! Estive por lá em março conversei bastante com o pessoal, amei demais os vinhos, mas para mim, um ainda leigo em vinho, não senti diferença entre o Brunello e o Rosso, ele comentaram a diferença usado processo rigoroso da produção dos DOCG que tem que ser das uvas dos parreirais mais próximas da vinícola, mas tb comentaram que o Rosso é produzido com as mesmas uvas (100% do estudo) mas de um terroir mais distante da vinícola.
Mas como falei pode ser porque sou leigo, mas quer muito voltar lá e beber o Brunello Poggio. Esse na degustação, Meo Deos que demais, uma garrafa de 90€ e por aqui pra lá de 1k.
Outra vinícola que vc poderia fazer um poste é a Mazzei, demais!
Bjos inté, vou te seguir.
Oi Ney Que legal que vc já conheça lá in locco. Eu ainda preciso ir conhecer. Fiquei morrendo de vontade depois de aprender todos esses detalhes e cuidados que eles têm. Quanto a diferenças entre o Rosso e o Brunello, apesar das diferenças legais (como o tempo mínimo de envelhecimento que cada um deve passar em barricas e em garrafa, por exemplo), as diferenças sensoriais podem ser bem sutis mesmo e eventualmente difíceis de notar (até por gente experiente). Na apresentação que eu assisti também foi comentado sobre as uvas serem de qualidade muito parecida, mas uma parcela maior ser destinada à produção do Rosso por questão econômica (pelo que pude entender, eles não podem “inundar” o mercado com Brunellos. Sorte nossa que assim podemos encontrar ótimos Rossos DOC, bem mais baratos!). Tintim!